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Da Redação
Parintins/AM - Nos primórdios da brincadeira de boi-bumbá, em Parintins, a participação da mulher se resumia em ornamentar o terreiro para o boi brincar, confeccionar as fantasias dos brincantes e seguir o boi, mas apenas ao redor do cortejo. Porém, com o passar do tempo, as mulheres conquistaram cada vez mais espaço e, atualmente, estão com vez e voz. No Garantido, essa presença é forte e sentida em todos os setores.
De uma época, onde as mulheres tinham quase nenhum espaço nos bois, Maria do Carmo Monteverde, filha do fundador do Boi Garantido Lindolfo Monteverde, revela que a brincadeira era muito diferente e os homens não deixavam as mulheres participarem. “As mulheres só faziam ajudar. Só obedecemos até meu pai falecer. Após isso, passamos a participar mais, até porque somos mais animadas”, diz comemorando que hoje todos podem brincar juntos e a participação das mulheres aumentou.
Ida Silva é um exemplo da conquista de espaço. Batuqueira do “surdo”, há 16 anos, hoje ocupa o cargo de vice-presidente do Boi Garantido. “Já percorremos um longo caminho de colaboração na cultura popular de Parintins. Hoje, saímos dos ateliês, dos grupos e estamos também na direção do maior bumbá de Parintins, e cada vez mais estamos conquistando nossos espaços”, afirmou.
Foto: Divulgação
Para ela, ocupar cargo de liderança é um exemplo de persistência e resistência ao longo da história da mulher. “Por sermos mais sensíveis e buscarmos sempre um ambiente harmônico, além de termos um instinto maternal, nós mulheres, na liderança, estamos sempre prontas a ouvir e a considerar as percepções e ideias”, garantiu.
Pioneirismo
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Izoney Tomé, primeira mulher a presidir o
Movimento Amigos do Garantido (MAG), recorda que existem histórias fortes de mulheres, na trajetória do Garantido e vê com otimismo a presença feminina no Boi da Baixa do São José. "Temos uma Vice-Presidente nos representando. Tivemos uma mulher na Comissão de Artes e acredito que não está longe uma mulher na presidência. A cada dia as mulheres mostram um formato novo de administração com resultados excelentes”, analisou ela, que afirma que o amor pelo Garantido é algo sem explicação, grandioso e mágico.
Mulheres no galpão
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Com algumas décadas trabalhando nos galpões do Garantido, Maria da Costa, a “Maria Fogueteira” recorda quando era a única mulher no espaço. “Era só eu no meio de muitos homens. Agora tem outras, mas antes era só eu mesmo”, diz. Para ela trabalhar em chão de galpão sempre foi algo natural. “Trabalhei com muitos artistas que reconheceram meu talento. Todos sempre me respeitaram”, afirma ela que foi contemporânea do Mestre Lindolfo Monteverde.
No ateliê
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Fazendo história, Rafaela Souza, torna-se a primeira artista mulher a assinar como figurinista do boi Garantido e no Festival Folclórico de Parintins. “No meio, até então predominante de homens, é imensa a satisfação com essa conquista. O Garantido sempre esteve presente minha vida, desde infância e hoje estou me realizando como artista em poder fazer um figurino para um item oficial do meu boi representando todas as mulheres, que por muito tempo estiveram nos bastidores da festa”, comemora.
Amor de geração à geração
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Por outro lado, Dona Celina Oliveira Fernandes, 92 anos, parintinense, nascida na comunidade do Saracura, sempre demonstrou a resistência feminina, na Batucada, onde tocou na palminha por mais de 30 anos. O Garantido é tão forte, tão presente e vivo dentro dela, que mesmo acometida pelo Alzheimer, jamais esqueceu o Boi da Baixa do São José. “Vovó representa a perpetuação do Festival. Como mulher, representa a resistência. Por meio dela, desse amor que tem pelo Garantido, todos nós trazemos conosco esse vermelho gravado na alma. Ninguém virou Garantido aqui em casa, nós já nascemos Garantido. São 92 anos de pura vitalidade, de muita força e de um olhar que diz tudo”, analisa a neta Katrícia Fernandes, que assim como a avó ingressou na batucada.
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Herdeira do amor familiar pelo boi vermelho e branco, Katrícia Fernandes, há 18 anos toca rocar no corpo rítmico. Ela analisa que ser mulher no Garantido representa a delicadeza e, ao mesmo tempo, a força dentro de um meio quase sempre dominado por homens. “O Garantido representa o amor materializado em forma de um boi de pano. É a batida mais forte de um coração que não se controla, só se sente. O Garantido é povo, vem do povo e a voz do povo é a voz de Deus. Esse boi me move, transforma, arrepia, emociona, principalmente quando penso na vovó Celina. Ela é história viva. Falar em Garantido é falar dela, desse amor que perpassa tudo”, emociona-se.
Honra
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Ser uma torcedora mulher no Garantido é uma honra, enfatiza a empresária Ana Paula Perrone, que já foi porta-estandarte e sacerdotisa Tupinambá. “É um sentimento surreal estar numa disputa para ajudar o Garantido a ser campeão”, constata ao comentar sua participação na arena. Lembra que as mulheres começaram a brincar de boi, a partir da década de 1970 e hoje estão em todos os setores do boi. Perrone cita como mulheres guerreiras do Garantido, as “Comadres”. Ana Paula também destaca seu amor ao boi vermelho e branco. “O amor que tenho pelo Garantido é quase fraternal. Estar com ele me traz paz, força e felicidade”, resume.
Imprensa
Com um grande número de torcedores na imprensa, o Garantido tem seus expoentes. É o caso da jornalista Édria Caroline, que sempre faz questão de exaltar esse amor encarnado. Ela recorda que o primeiro contato com o Garantido foi em 2000, assistindo o festival pela TV. E não teve jeito, foi amor a primeira vista. “De lá pra cá, esse amor só aumentou, fortaleceu. Hoje, o Garantido faz parte da minha vida”, afirma.
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A jornalista faz a cobertura jornalística do festival desde 2014. Ela revela que ainda em 2014 foi convidada para ser assessora do vermelho e branco. Nos anos de 2015, 2016, 2018 e 2019 Édria cobriu o evento por diferentes veículos de comunicação. A experiência lhe permite avaliar que atualmente a participação da mulher está cada vez mais forte dentro do Garantido. “Isso me deixa feliz. Sabemos que a mulher tem um olhar diferenciado sobre tudo, e levar esse olhar para um projeto de arena, para uma direção de espetáculo, contextualizar e enaltecer a força feminina não só no discurso mas, principalmente na prática, me deixa extremamente orgulhosa do meu boi”, garante.
Édria concluiu que o amor pela festa e principalmente pelo Garantido não se resume apenas em admirar um boi de pano. “É um amor inexplicável, é uma emoção que se transforma em lágrimas a cada encontro nosso no bumbódromo. É aquela ansiedade que faz o coração bater forte a cada início de apresentação”, finalizou.